A melodia do corpo
Weynna Dória
Diante da decepção de alguns resultados da Academia na premiação do Oscar 2012, precisei, de alguma maneira e ainda que pouco, tentar reparar a injustiça cometida pela revelação do resultado de Melhor Documentário. Mesmo não tendo assistido a todos os outros candidatos e nem ter tido a oportunidade de ver “Pina” (2011) no cinema (com estreia no Brasil prevista para 16/03/2012), não acredito que haja justificativa para o documentário não ter levado a pomposa estatueta para casa.<br /><br />“Pina” é mais que um documentário inspirado no trabalho da bailarina Pina Bausch é também uma bela homenagem póstuma e um trabalho memorável do diretor e documentarista Wim Wenders.<br /><br />O diretor nos apresenta intimamente a companhia de dança e teatro da coreógrafa alemã que revolucionou o mundo da dança contemporânea. E, nos envolvendo logo de início no ritmo intenso de Igor Stravisky com a adaptação feita por ela de “A Sagração da Primavera”, mostra a que veio.<br /><br />O documentário foi concebido pela própria Pina juntamente com Wenders, mas em virtude de sua morte em 2009, Wenders se viu obrigado a dar continuidade ao projeto sozinho, o que se tornou uma forma de elaboração do luto para o diretor e para todos da companhia. O filme é um misto de depoimentos, trechos de ensaios e de suas peças mais famosas – “Café Müller”, “A sagração da primavera”, “Lua Cheia” e “Kontakhof”. Segundo Wenders, a profundidade dos palcos nessas obras foi explorada com a tecnologia 3D na intenção de passar ao espectador a sensação de estar assistindo os espetáculos em um teatro, tornando ainda mais fascinante nossa experiência fílmica.<br /><br />Wenders inova, ainda, o modelo convencional de entrevistas ao qual estamos acostumados. Como expressão de luto, a imagem dos bailarinos e amigos, na tela permanece muda e apenas suas vozes são ouvidas no plano de fundo. Assim, seus depoimentos soam como pensamentos nostálgicos, nos quais são compartilhadas as emoções e experiências que tiveram ao lado de Pina. Essas experiências são especialmente importantes para os bailarinos que a conheceram de perto e foram tocados por sua sensibilidade, trabalhando com ela durante muitos anos dentro da Companhia do Teatro de Wuppertal, na Alemanha. As instalações deste teatro serviram de cenário para Pina e, consequentemente, para Wenders em suas criações.<br />Mesmo que assim pareça, essa obra não é apenas um documentário sobre a vida da coreógrafa e bailarina Pina Bausch, é, também, uma forma de mostrar o que seu trabalho representou para o mundo. Em especial para o mundo da artes, da dança e do teatro. Com trilha sonora com músicas de diversos países (inclusive Leãozinho, de Caetano Veloso) e depoimentos de bailarinos de diversas nacionalidades em vários idiomas, Wenders cria uma metáfora da universalização da dança e dos movimentos do corpo, que transpõem barreiras geográficas e culturais existentes entre os homens. O filme nos faz perceber o processo criativo da coreógrafa e seu poder de enxergar dentro de cada pessoa a melodia que move seus corpos, de interpretar suas emoções e de transformá-las em movimento, em dança.<br /><br />“Pina”, com um apanhado de boa música e fotografia marcante, revive a sensualidade, a irreverência e a beleza sublime da arte da dança nas coreografias de uma das maiores bailarinas do século XX, Pina Bausch.
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