conhece-se a crise andando de táxi", outros há que passam por ela de limousine.
MIGUEL COSTA
<p>Através de obras como "A Mosca" (1986), "Gémeos" (1988), "Nacked Lunch" (1991), "Crash" (1996), "EXistenZ" (1999), "Spider" (2002) - citando apenas aquelas que visionei - Cronenberg transformou-se num icone do cinema underground, pelo extremismo e provocação das suas "deambulações mentais", com filmes a "transpirar por todos os poros" (e à bruta) de transformações, mutações, infecções, horror(es), alienações, quase sp exploradas através do "dark side" da mente (e tudo isto sempre "embrulhado" - em doses mais que q.b. - de alucinações visuais). Em 2005, com "A História da Violência" o realizador iniciou uma inflexão no rumo da sua carreira (que culminou, em 2011, com o aborrecido "Método Perigoso"), passando a ter por prioridade não tanto o "expor" (como até então tinha sido seu apanágio), mas sim procurar o "porquê" dos comportamentos humanos (com esta mudança de paradigma os seus projectos perderam a dose de loucura que tão bem o caracterizava - embora a sua "impressão digital" se mantenha sp presente, mesmo que de modo indelével - e passaram a ser mais narrativos e "cerebrais").<br /><br />Com o magnifico trailler de apresentação de "Cosmopolitan" tive a secreta esperança de um "retorno ao passado", mas foi "sol de pouca dura", pois após a sua estreia em Cannes a critica especializada logo se apressou a desfazer tal "equivoco". Aliás, logicamente, outra coisa não seria expectável, uma vez que actualmente o Cronenberg defende que " O CINEMA É A PALAVRA e um rosto, e não o Grand Canyon" ... E tantas são as palavras (e conceitos) com que nos "bombardeia" neste filme q, não poucas vezes, corremos o risco de ser arrastados (quase que irremediavelmente) pela sua "forte torrente" (pelo que um 2ª visionamento talvez não seja nada má ideia, para "capturar" novas ideias, ou "apenas" redefinir as primeiras leituras mais superficiais). E como isso é bom (sim, eu sou masoquista!), pois tudo o que nos é "dado de bandeja, faz-nos perder a pica".<br />A fina ironia de Cronenberg começa logo com a escolha do protagonista, o mais que improvável Robert Pattinson (que no filme é a personificação do capitalismo materialista, imoral e (as)sentimental - cuja era de excesso(s) entrou em processo de autodestruição). De facto, haverá melhor metáfora para o "sistema" que escolher alguém que é conhecido em todo o mundo (e nas galáxias seguintes) como o "Mister Vampiro"?<br />O filme é uma espécie de manifesto anticapitalista, e consequentemente nele são "aflorados" temas como a disparidade social, o individualismo, a invasão da tecnologia em todos os âmbitos da vida humana, a insensibilidade do homem face à dor alheia, o poder do dinheiro (que é distribuído de forma errática, e com resultados imprevisíveis - como é mencionado nalguns dos diálogos: " Hoje já não se matam presidentes - o individuo já não é ameaça - , especula-se, através do jogo, sobre a economia dos países que queremos liquidar - sem outro objectivo que não ganhar mais uns trocos"; "O dinheiro está a falar sozinho. O presente está a ser sugado do mundo"; "Nós somos apenas soldados robots impotentes") ... E enquanto o "mundo implode" a missão primordial da vida deste capitalista é atravessar a cidade, na sua "limousine kitada" (mais uma metáfora magnifica à bolha de protecção em que estes "ditadores" vivem), para ir cortar o cabelo, e assim tentar distrair-se um pouco (e esquecer-se que perdeu alguns biliões de dólares nas suas últimas apostas). HÁ QUEM CONHEÇA A CRISE ANDANDO DE TÁXI, OUTROS HÁ QUE PASSAM POR ELA DE LIMOUSINE (não é para quem quer, é para quem pode!)</p>
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