É sempre com relutância e com bastante militância que vou ver os filmes de alguns realizadores locais, que têm por hábito fazer filmes só para êles e amigos, graças aos subsídios que nós, o público, pagamos. Este foi para mim o mais compreensível filme de Manoel de Oliveira (também o foi "Vou Para Casa"). Só que o carácter de mensagem e de pedagogia parece retirar-lhe alguma arte. Tem também alguns defeitos que não são compreensíveis em quem consegue reunir um tal lote de actores (aquele "consommé" do jantar com pratos vazios é ridiculo). Aprecio a mensagem de um homem de 94 anos, nestes tempos turbulentos. Dificilmente será aceite na candidatura final para o Óscar...

"Um filme Falado" revela mais uma vez o profundo sentido ético de Manoel de Oliveira. É uma visão do mundo, presente em todos os seus filmes, que está no cerne das histórias da História que Rosa Maria conta à filha. Ela olha-nos da amurada do navio (ou será Oliveira que nos olha e dialoga connosco?), mais do que enfrenta o olhar errante da meiga criança que conduz pela mão. As perguntas desta serão pacientemente respondidas, sem necessidade de ameninar o discurso, qual professora exigente e um pouco distante, mas atenta às dúvidas do pensar inocente. Filme didáctico? Pois sim, e porque não? Não continuamos todos a precisar de lições de vida? Oliveira mostra com este filme que continua a interessar-se pelo mundo que o rodeia e deseja exprimir, através da sua arte, a sua visão tão pessoal e humanista. O berço da civilização ocidental revisitado por uma mãe e sua filha, em demanda do pai, a Europa seduzida pela América (e vice-versa), os portugueses e a sua marginalidade à mesa dos convidados principais, a metáfora da viagem e do banquete abruptamente interrompido pela tragédia... No final do filme já não é a professora de História que nos olha, é o homem horrorizado, petrificado pelo "fim da história"!

Uma viagem às raízes da nossa civilização, pedagógica e construtiva. Uma forma original de instruir toda a sociedade. As perguntas que todas as crianças fazem (ou deveriam fazer) e a que a maior parte dos pais não sabe responder. A nossa civilização é riquíssima e este filme retrata-a como "ela" merece. Simples, didáctico e do maior interesse para todos. Não é mais um filme sem conteúdo, antes pelo contrário, forte em História sem necessitar de efeitos especiais. Actualíssimo agora e sempre. A não perder.