//
Agnus Dei - As Inocentes
Título Original
Les innocentes
Realizado por
Elenco
Sinopse
Polónia, Dezembro de 1945. Após a vitória dos aliados na Segunda Grande Guerra, Mathilde, médica da Cruz Vermelha, encontra-se em missão de ajuda aos sobreviventes dos campos de concentração nazis. O horror a que todos os dias assiste é desmedido, mas ela tenta a todo o custo minorar o sofrimento dos que dela precisam. Um dia, é procurada por uma jovem noviça que lhe implora que vá consigo ao convento onde várias freiras precisam de auxílio. Apesar de reticente, acaba por se sentir impelida a ajudá-la. Nesse lugar, para sua surpresa, vai encontrar sete freiras em final de gravidez. Meses antes, o convento foi invadido por soldados soviéticos que as violaram durante vários dias. Incapazes de conciliar a sua fé com a perda da virgindade, aquelas mulheres não conseguem superar o trauma de carregarem no ventre o fruto de um crime, delas e dos homens que as violentaram.
Com assinatura da luxemburguesa Anne Fontaine ("Coco avant Chanel", "Paixões Proibidas", "Gemma Bovery"), um filme dramático que se baseia num caso real. O elenco conta com a participação de Lou de Laâge, Agata Kulesza, Joanna Kulig, Agata Buzek e Vincent Macaigne. PÚBLICO
Críticas dos leitores
A Fé e a Razão
Pedro Brás Marques
<p>“O horror! O horror!”, sintetizou, na perfeição, o Cor. Kurtz de “Apocalypse Now”, sobre os efeitos por vezes inimagináveis da guerra. Há tragédias que todos conhecemos mas, outras, ficam escondidas, por vergonha ou porque, simplesmente, são demasiado tenebrosas para verem a luz do dia. <br />É precisamente este o caso de “As Inocentes”, uma produção franco-polaca, centrada num convento polaco, no fim de 1945. A II Grande Guerra havia terminado, mas um grupo de freiras continuava a vivê-la porque as tropas libertadoras soviéticas, quando por ali passaram, violaram-nas, no que resultaria em sete gravidezes. Perdidas entre o pecado, a culpa, a sua Fé e a atitude de encobrimento da Madre Superior, as freiras acabam por encontrar uma mão amiga em Mathilde, uma jovem médica da Cruz Vermelha francesa, em missão na Polónia, que é chamada em desespero por uma delas para atender uma irmã em trabalho de parto. <br />Perante a monstruosidade da violência de que as freiras foram alvo e a forma como a Igreja pretende resolver o assunto, enviando os bebés para adopção, Mathilda, comunista e ateia, surge como um anjo protector, encarando um verdadeiro espírito de fraternidade e solidariedade. Vai ser o uso da sua razão a salvar várias vezes aqueles cordeiros de Deus das garras do lobo que não se interessa pelo sofrimento ou pelo destino delas, mas sim pelo bom nome do Mosteiro e, naturalmente, da Igreja. </p><p><br />A virtude deste filme , interpretado e realizado sempre por mulheres, é a de levar o espectador a uma reflexão profunda sobre os limites da religião. Com efeito, as irmãs vivem obcecadas por, na sua visão, carregarem o pecado, por terem violado o dever de castidade, por serem portadoras dum “passaporte” para o Inferno e a perspectiva da Fé parece ser o único caminho para a sua Salvação. Será? Numa visão objectiva, naturalmente não têm culpa alguma mas, sob o manto católico, tudo se transforma, o que é sublinhado e exaltado pelo comportamento encobridor da principal responsável que, num primeiro momento, até a salvífica ajuda médica rejeita. Este quase fanatismo choca, claro, com a vontade de viverem e, até, com a vontade de manterem os filhos deste “pecado” junto de si. A luta entre o querer e o dever atinge proporções difíceis de conceber noutro contexto que não o religioso. </p><p><br />Apesar do dramatismo da situação, Anne Fontaine consegue escapar entre os pingos de chuva do melodrama, recorrendo, por vezes, a um humor subtil e a um conjunto de imagens que gerem inteligentemente o propósito da história. Recordo, por exemplo, como tudo é enganadoramente imaculado por debaixo do manto branco de pura neve ou as crianças que sobreviveram à guerra e se entretêm a brincar em cima dum caixão… <br />A médica Mathilde é interpretada por Lou de Laâge que consegue de forma perfeita manter o equilíbrio entre alguém que quer ajudar, que sabe que há quem precise vitalmente dessa ajuda, mas que não a quer receber. A sua luta é discreta mas eficaz, contrapondo a razão do seu julgamento à emoção que preside ao juízo das irmãs. Agata Kulesza já tinha brilhado em “Ida”, outra produção polaca e volta a ser fantástica no papel da Madre Superior, em especial na gestão dos silêncios e dos olhares com que domina a vida no Convento. <br />O “happy ending”, talvez com açúcar em demasia, em nada colide com a profundidade e o dramatismo desta terrível história, contada com a segurança e a sensibilidade exigida por algo tão frágil.</p>
Continuar a ler
Envie-nos a sua crítica
Submissão feita com sucesso!