Mar adentro
Gonçalo Sá - http://gonn1000.blogspot.com
"Roda Livre" ("Bottle Rocket"), "Gostam Todos da Mesma" ("Rushmore") e "Uma Comédia Genial" ("The Royal Tenembaums") contribuíram para que muitos incluíssem Wes Anderson entre a nova - e criativa - vaga de realizadores norte-americanos, uma geração oriunda dos anos 70 que cresceu a ver Spielberg, Coppola e Scorsese e que nestes se inspira para reformular os códigos cinematográficos. Tal como Sofia Coppola, Paul Thomas Anderson e Spike Jonze, também Wes Anderson aborda frequentemente a temática da solidão, da família ou da inadaptação, algo que se encontra bem presente no seu novo filme, "Um Peixe Fora de Água" ("The Life Aquatic With Steve Zissou"). Mais uma vez há um elenco de personagens peculiares e atípicas que oscilam entre o bizarro e o "offbeat", vivendo quase sempre numa constante apatia emocional e em esferas de indiferença.<BR/><BR/>O filme segue as peripécias de Steve Zissou (Bill Murray), um oceanógrafo de meia-idade determinado a capturar e eliminar uma criatura marinha responsável pela morte de um dos seus amigos e companheiros de bordo. Na sua jornada será acompanhado por uma diversificada tripulação que inclui, entre outros, a sua gélida esposa (Angelica Houston), o seu recém-descoberto suposto filho (Owen Wilson) e uma instável jornalista que acompanha a expedição (Cate Blanchett).<BR/><BR/>Pelo meio há um estilo visual muito próprio e facilmente identificável que recupera influências dos anos 70 e revela uma cuidada atenção ao pormenor, tanto nas figuras marinhas animadas digitalmente como em todos os cenários e adereços das personagens. A banda sonora do brasileiro Seu Jorge apresenta versões em português de canções de David Bowie e é mais uma prova da inventividade de Anderson, capaz de misturar elementos que se julgariam inconciliáveis.<BR/><BR/>Infelizmente, a criação de um universo singular com consideráveis doses de ironia e provocação não bastam para que um filme resulte, e "Um Peixe Fora de Água" é - como o é toda a a obra do relizador - disso exemplo. A película é mais uma excêntrica "dramedy" que, embora contenha sequências inspiradas, não satisfaz nem como drama nem como comédia. A gestão da tensão dramática é no mínimo desequilibrada, uma vez que as cenas sérias são abruptamente interrompidas por momentos de humor corrosivo e vice-versa, gerando uma estranha amálgama que só funciona a espaços.<BR/><BR/>Ora desencantado e melancólico, ora áspero e cínico, o filme congrega episódios tão impresvisíveis quanto qualitativamente desiguais e, em alguns momentos, o tom paródico chega a ser ridículo, como na cena de tiroteio com os piratas (despropositada e exagerada, ainda que intencional).<BR/><BR/>As personagens também não são especialmente intrigantes, uma vez que nunca se afastam da caricatura e não chegam a ser aprofundadas (o que é pena, porque têm potencial). O protagonista será a única excepção, mas é apenas mais uma oportunidade para Bill Murray fazer de... Bill Murray, expondo a pose e trejeitos que já não congregam grandes doses de surpresa e apenas oferecem mais do mesmo.<BR/><BR/>"Um Peixe Fora de Água" é demasiado "espertalhão" para se tornar envolvente e, por isso, as sequências que poderiam suscitar algum impacto emocional soam a falso e não geram reacção, tornando o filme num objecto curioso mas que não é mais do que um irregular concentrado de "gags nonsense"... Classificação: 2/5 - Razoável.
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