Documentário deprimente sobre a crise vista por um francês
António Soares
Já com muitas décadas de anos às costas e milhares de quilómetros de celulóide percorridos, muitos deles nas maratonas de 24 h do saudoso Quarteto, onde tive a minha dose de "filmes intelectuais", não espero ficar deslumbrado sempre que vou ver uma fita. De facto, já nem me lembro bem qual foi o último filme em que isso me aconteceu... Talvez o "American Beauty" do Sam Mendes, há muitos anos. Ou os hiperbólicos filmes do Tarantino, que podem ser vistos como exageros comico-trágicos mas com uma boa carga de diversão... <br /> <br />Mas, mesmo sem deslumbramento, muitas vezes nos "filmes-família" fico satisfeito e saio divertido da sala, tal como aconteceu recentemente com os previsíveis 007 e "Star Wars". Não estou então à espera de uma obra prima, mas dou umas risadas à conta das cenas "banhada" ou da pirotecnia e de outros efeitos especiais. Os enredos, nestes filmes, são infantis... <br /> <br />Na tabela da crítica do Público dos últimos dias "A Lei do Mercado" é o filme melhor classificado. É francês, e nos últimos anos saíram alguns bons filmes franceses (de chofre, recordo o "Amigos Improváveis"). Assim, resolvi descalçar as pantufas e ir vê-lo com uma filha. <br /> <br />Ora bem, acontece que o filme é um documentário deveras deprimente focado num operário francês de meia idade recém-desempregado, da classe média-baixa; um filme sobre uma família apanhada pelas consequências "da crise". <br /> <br />Todo filmado com "a câmara montada no ombro do operador", com imagens a tremelicar, emula uma reportagem "ao vivo" no telejornal, decerto para realçar o realismo e poupar nos custos da filmagem. Vão passando imagens de cenas "lugar-comum" e previsíveis de acontecer a quem se encontra na meia idade, desempregado, com filho deficiente. Entrevistas de emprego, pedidos de empréstimos na banca, tentativas de venda dos parcos bens da família, lamentos sobre o posto de trabalho perdido. Por fim, empregado de novo como segurança numa "grande superfície", o homem termina o filme a desmascarar roubos de bifes e de carregadores de telemóveis e as vigarices dos operadores de caixa. <br /> <br />Sessão da meia noite. Só não fugi da sala a meio porque tinha que esperar por uma pessoa até tarde. À saída, com o único outro par de pessoas presente na sala dissemos umas piadas amarelas sobre o filme e terminamos com "votos de melhor escolha" na próxima ida ao cinema. Foi a única parte divertida da sessão. <br /> <br />Os críticos do Público aparentemente perderam a noção da diversão no cinema. Tendo em conta as estrelas do "A Lei do Mercado", pelos vistos premeiam o cinema deprimente. Deixem-me, por uma vez, desta vez, ser crítico dos críticos... <br /> <br />Já vi ao longo de quatro décadas milhares de filmes, bons e maus, leves e duros, divertidos e nem tanto, comédias e tragédias... Este "Lei do Mercado" é uma seca. Dou uma estrela ao desempenho do actor principal, Vincent Lindon, e apenas a isso. Filme a evitar. <br />
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