Intriga internacional
Gonçalo Sá - http://gonn1000.blogspot.com - http://cine7.blogspot.com
Através de filmes como "África Minha" ou "Os Três Dias do Condor", Sidney Pollack tornou-se num dos mais reputados cineastas norte-americanos das últimas décadas, apresentando uma obra diversificada e geralmente meritória. No entanto, na década de 90 essa consistência não foi tão visível, uma vez que nem "Sabrina" nem "Encontro Acidental" estavam à altura dos seus melhores títulos e colocaram algumas reservas quanto à carreira do realizador. O recente "A Intérprete" ("The Interpreter") não é o golpe de génio que fará com que Pollack se inclua no grupo de cineastas de primeira linha da actualidade, mas é um inspirado e muito seguro regresso à boa forma. Um "thriller" político seguidor dos modelos clássicos - que, de resto, Pollack ajudou a implementar -, aborda as peripécias de Silvia Broome (Nicole Kidman), uma intérprete das Nações Unidas que ouve uma conversa no edifício da ONU e crê que esta se refere a uma tentativa de assassínio de um governante de uma nação africana.<BR/><BR/>A partir daqui, gera-se uma atmosfera de inquietação à medida que a protagonista começa a ser perseguida por conspiradores e é também tratada com alguma desconfiança pelo agente federal responsável pela sua protecção, Tobin Keller (Sean Penn).<BR/><BR/>"A Intérprete" parte de uma premissa curiosa e consegue proporcionar uma execução equilibrada, apostando num coeso trabalho de construção do argumento que mescla competentemente tensão emocional com cenas de considerável suspense. Pollack dá espaço às personagens, criando uma interessante relação entre o par protagonista, com tanto de conflituoso como de empático. Os actores estão à altura, superando os estereótipos que poderiam surgir por aqui, e há bons momentos de estranha cumplicidade como a cena da conversa de telemóvel à noite, comprovando que um "thriller" não tem de subjugar as personagens às cenas de acção.<BR/><BR/>Sofisticado e envolvente - como grande parte das obras do cineasta -, o filme contém um olhar actual e pertinente sobre a conjuntura política internacional, com referências mais ou menos óbvias a questões controversas (em particular às conturbadas realidades de alguns estados africanos, como o Mugabe). O evidente apelo a uma postura pacifista e diplomática, reforçado pelo destaque dado às Nações Unidas - este foi, aliás, o primeiro filme a incluir cenas filmadas dentro do edifício da ONU - pode ser um pouco simplista, mas nunca forçado, e a complexidade das temáticas em jogo fazem com que este "thriller" esteja acima de grande parte da concorrência recente.<BR/><BR/>Pollack gere o projecto com subtileza e elegância, dispensado sequências frenéticas e "over-the-top", o que não impede que não forneça alguns momentos de antologia, como a bem construída cena do autocarro, claustrofóbica e intrigante. Apesar do ritmo geralmente pausado, a película não se torna cansativa nem redundante, dado que o cineasta revela aptidão para a criação de um absorvente "thriller" intimista e de inatacável profissionalismo.<BR/><BR/>"A Intérprete" não traz nada de especialmente inventivo ou transgressor, é apenas - e já não é pouco - uma obra coerente e bem trabalhada, capaz de funcionar como entretenimento sem ser um atentado à inteligência do espectador. Dentro do género, somente "O Candidato da Verdade", de Jonathan Demme, exibiu tamanho rigor e desenvoltura nos últimos tempos, por isso esta é mesmo uma obra a não perder. Classificação: 3/5 - bom.
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