Cr´tica de The Mist
Passenger
De vez em quando, saem filmes que, de tão maus, chegam a enfurecer. The Mist, mais uma colaboração entre Frank Darabont e Stephen King, é um conto de terror, em que uma estranha tempestade espalha um nevoeiro denso, que esconde criaturas com grande apetite, e vão forçar um grupo de cidadãos de uma pequena vila a refugiarem-se num supermercado local por tempo indeterminado. Logo à partida, quantas vezes é que já se viu esta fórmula?<BR/><BR/>Mas tente-se deixar essa constatação de lado, porque várias foram já as vezes que a limitação do enredo não inviabilizou alguma originalidade (lembre-se o sucesso que foram Shaun Of The Dead ou 28 Days Later no género "zombie"). Há um ponto relevante em The Mist: a atenção que Darabont teve em fazer ressoar algumas preocupações da sociedade actual, o exemplo mais óbvio sendo a personagem Mrs. Carmody (Marcia Gay Harden) e o seu extremismo religioso. O seu comportamento e discurso vão aviltar grande parte do grupo em pouco tempo de reclusão, passa de uma lunática bizarra a uma profetisa em tempo de desespero. É assustador verificar que a humanidade dos que a rodeiam se esvanece rapidamente (ao contrário do nevoeiro, que persiste, imperscrutável), que a sua palavra passa a ser seguida, apesar de não oferecer nenhuma solução, apenas violência e ilusão. Para além disto, claramente, o medo, do desconhecido, e, por vezes, de outros como nós, é um tema recorrente, e há ainda espaço para incluir a culpabilização do exército de actividades perigosas e mesmo sem sentido, uma linha de enredo que, porventura, será mais direccionada aos espectadores Americanos.<BR/><BR/>Mrs. Carmody é uma figura muito bem construída. O resto não. Temos meia dúzia de personalidades que já foram criadas há décadas, e quase podemos prever os seus diálogos e reacções. Temos sempre alguma voz a sublinhar a base psicológica de cada cena, condescendência para com quem está a ver o filme que não dá para suportar. E temos interpretações carentes e displicentes. Thomas Jane, coitado, não consegue carregar um filme. Não consegue, pura e simplesmente não se lhe pode dar um papel principal. Marcia Gay Harden é falsa e a actriz menos subtil a trabalhar em Hollywood de momento, mas tem a sorte de tal ser minimamente adequado aqui. Não deixa de ser um prazer (um pouco depravado) ver, depois de anos de tortura em óptimos filmes que não são perfeitos por sua causa (Miller's Crossing, Mystic River), a sua cabeça trespassada por uma bala.<BR/><BR/>Aliás, este filme tresanda a amadorismo por todos os poros. Se viram The Shawshank Redemption ou The Green Mile, terão certamente ficado fascinados com algumas das imagens poderosas que evocam, com os grandes planos e o trabalho de câmara sóbrio que os atravessa. Isso não existe em The Mist. Toda a realização parece improvisada e apressada, como num episódio da série The Unit, mas com fotografia muito mais banal. Os efeitos especiais são do mais retardado e artificial que alguma vez se viu numa produção milionária deste tipo, tentáculos pixelizados cujos movimentos não se adequam aos dos actores com quem partilham as cenas. Há falhas no suposto realismo do filme que detraem a experiência, como um gerador barulhento, mas só quando ninguém está a falar, ou sacos de comida para cão que se multiplicam do nada, conforme a necessidade dos lojistas.<BR/><BR/>Isto sem esquecer os enredos sem solução e estereótipos do argumento, que se sucedem a ritmo alucinante, e as más soluções que Darabont escreveu em certas partes. Uma mulher que sai da loja a correr logo no início da trama, e que, milagrosamente, aparece sã e salva nos últimos segundos de película. Soldados suicidas. Um fim deveras irracional e desadequado, que apenas tenta jogar com a nossa sensibilidade.<BR/><BR/>Há tanto de problemático, forçado e simplesmente errado com The Mist, que é difícil formar qualquer ligação com a acção e emoção que tenta desenvolver. O que se passa com Frank Darabont? Não sei, mas devo dizer que nasceu em mim muito receio pelo que a sua adaptação de Fahrenheit 451, o livro clássico de Ray Bradbury, poderá vir a ser, para além do mestre da Nouvelle Vague Francesa, François Truffaut, ter já feito uma adaptação excelente, há mais de 40 anos. Em 2009 se verá. Por enquanto, evitem The Mist a todo o custo.<BR/><BR/>2/10<BR/><BR/>Crítica escrita para: http://haveraerraticidade.blogspot.com/
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