Várias Alemanhas, como só alemães poderiam mostrar
Nazaré
O percurso de vida do protagonista, um artista plástico educado na RDA e que fugiu a tempo, com a mulher, para a RFA (iiihh... como isto soa esquisito, nos dias de hoje!), serve de pretexto para lançar mais um olhar sobre a História da Alemanha no século XX, marcada por esse momento traumático dos 12 anos de nazismo. Muito na linha de algumas magníficas séries que têm passado na RTP2 nos últimos tempos, mas com o benefício insubstituível da sala de cinema, para a qual foi feito. <br /> <br />Alguns acharão estes temas pouco interessantes, ou acusarão estes filmes de ideologia; fanatismos à parte, eu que sou dos que se interessa, acho que este filme procura ser muito pouco ideológico (e alguns o atacarão por isso, também). Filma pessoas comuns (há uma fora do comum, o ginecologista), conta histórias que representam épocas, e vê-lo feito desta maneira mostra como compete aos alemães contá-las duma maneira tão densa e real, e ficarmos gratos com isso. <br /> <br />É um filme de 3 horas, que se sente ser longo, sem dúvida, mas que não custa minimamente ver. Por este facto se deverá compreender a força da narrativa, o equilíbrio das partes que a compõem, as atmosferas contrastantes, a presença magnífica das personagens principais (o pintor, a mulher e o sogro dele), o prazer visual que se tem em cada momento; é uma obra de arte que merece ser vista. <br /> <br />Há também o tema das concepções de arte moderna, no ideal de pureza cultural dos nazis contra a "arte degenerada", no realismo socialista do bloco soviético, nas revoluções artísticas onde a tinta tem outros usos, e pode ser substituída por sebo e feltro. Aqui o filme fraqueja um pouco, mas é salvo pela muito bem encenada apresentação aos críticos, onde parece haver muitas mensagens subliminares que só mesmo o meio artístico será capaz de captar. Mas o principal do filme não está aí, está nestas personagens e nas suas vidas, nestas Alemanhas e nas vidas que se tentava ter dentro delas.
Continuar a ler