Atirar-se de cabeça
Rita Almeida (http://cinerama.blogs.sapo.pt/)
É Inverno e Paul (Roman Duris, "De Tanto Bater o Meu Coração Parou") está deprimido, em resultado da sua ruptura amorosa com Joanna (Joana Preiss). Regressando a casa do pai em Paris, desaloja o irmão mais novo, Jonathan (Louis Garrel, "Les Amants Réguliers"), para o sofá da sala, onde este é constantemente importunado pelo pai (Guy Marchand). Jonathan dirige-se insolentemente à câmara para nos informar que não é o herói desta história, mas o narrador. E lança a pergunta: o que leva uma pessoa a atirar-se de uma ponte por amor? O retrato de um dia na vida desta família é feito entre os dois irmãos, como dois diferentes pólos. Paul, sombrio e depressivo, Jonathan refrescante e luminoso, um profundo outro (aparentemente) superficial, mas unidos por um profundo afecto, como um género de Dom Quixote e Sancho Pança. Enquanto Paul (Duris numa interpretação profunda) acumula tristeza Jonathan acumula conquistas sexuais entre o Trocadéro e as vitrinas do Bon Marché, como se se estivesse a divertir no lugar de Paul, para o manter à tona. Mas apesar da sua tortuosa forma de individualismo, de uma mãe ausente (Marie-France Pisier), um pai excessivamente presente e a sua relação misto de conflito e ternura, esta família mantém-se unida, contra todas as previsões.<BR/><BR/>Sendo esta a verdadeira história de "Dans Paris", fica por entender por que razão Christophe Honoré ("Ma Mère") gasta tanto tempo da primeira parte do filme a contextualizar (de uma forma propositadamente confusa) a relação amorosa de Paul e Joanna, um "je t’aime moi non plus" de pequenas torturas, desejos contraditórios e dessincronias. O importante é estar em Paris no quarto com Paul e Jonathan a assistir a uma conversa que nunca se fez e que talvez nunca se fará. Não se entende exactamente onde Honoré pretende chegar com tantos momentos supérfluos.<BR/><BR/>Mas também, contra todas as previsões, este filme cria uma estranha sensação de encantamento. É poético, divertido, com diálogos impregnados de ironia e cinismo, um belo trio de actores e momentos verdadeiramente mágicos, como aquele em que Paul põe a tocar o single "Cambodia" de Kim Wilde, procurando injectar no presente uma emoção do seu passado. Mas a cena mais bela deste filme é, sem dúvida, o diálogo cantado ao telefone por Paul e Joana de uma música de Alex Beaupain: "Avant la haine, avant les coups, de sifflets ou de fouets, avant la peine et le dégoût, brisons là, dis-tu."<BR/><BR/>E se, como diz Joanna, "ser o grande amor de alguém, não quer dizer que tudo vai correr bem", ainda assim é preciso atirarmo-nos mesmo sabendo que nos vamos molhar. Foi o que Christophe Honoré fez. Nota: 6/10.
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