O problema do flashback
Pedro Maia
(A pedido de várias famílias, a partir de agora ficam avisados que nos meus comentários são reveladas partes importantes do filme, que podem incluir momentos-chave ou mesmo o final, mesmo que não o descreva minuciosamente.) Há alguns meses, arranjei este filme a um digno representante do nosso clero que ficou positivamente admirado com o filme. Achei estranho, mas tudo ficou esclarecido quando me apercebi que ele tinha feito a ligação entre este filme e o problema da escolha no filme "7even". Mais concretamente, à morte da modelo, a quem o homicida coloca numa mão um telefone para pedir ajuda e noutra uma caixa de barbitúricos, acabando ela por cometer o seu próprio suicídio, apesar de toda a situação ter sido "encenada" pelo assassino.<br/><br/>"Saw" parte deste problema, da escolha virtuosa do psicopata, que supostamente estabelece assim connosco um laço (como o caso de O'Ryan na primeira meia hora de "Suspect Zero", antes de ficarmos a saber que ele é um dos bons), mas os seus métodos são sempre de perder-perder, vivem da dependência do primitivismo humano, e portanto logo aí o filme ganha uma certa monotonia. Algúem vai ter de matar alguém para se safar, e a coisa é levada um pouco longe demais quando alguém tem de fingir ser um psicopata para satisfazer o desejo do psicopata (como é que alguém se torna automaticamente num psicopata só porque está a ser pressionado por um psicopata, ficámos nós sem saber, o que é um "loophole" muito grave), como se ser um psicopata fosse uma espécie de pó que se toma e pronto, já está. <br/><br/>Além disso, nos "flashbacks" nunca fica claro como é que a pessoa se safou, que tipo de investigação foi feita afinal e o final é totalmente aberto. Nem o psicopata morre, nem morrem os dois encarcerados, nem se avança na investigação, tudo em aberto, como se aqueles minutos todos não servissem para mais do que um intermezzo rumo à sequela. Quer dizer, eu até aceitava que o "twist" final em relação ao assassino estava bem arrancado, mas quer dizer, já que estávamos numa de esburacar o argumento porque é que o doutor Lawrence não reaparece para matar o assassino?<br/><br/>E já agora, qual a história deste assassino? Tipo, quando o argumento gira à volta da investigação, eu até aceito não saber quase nada do psicopata (como em "7even" ou no mais recente "Suspect Zero"), mas neste filme passámos 90 por cento do tempo a ver o "modus operandi" do tipo sem quase nenhumas referências relativamente à investigação; não merecíamos saber um bocadito de onde vem todo aquele prazer pelos jogos?<BR/><BR/>Para quem tem na sua "short list" de filmes de psycho películas de final aberto como "O Cubo 2", "Dreamcatcher", "White noise", "The Grudge", "Vidocq", este filme será aceitável, mas nem vos passe pela cabeça pensar que vão ter as mesmas sensações - aqui não há efeitos especiais, não há trabalho de montagem para evidenciar os momentos de suspense, não há montanha russa porque os "flashbacks" são apresentados como clips contínuos feitos a partir de uma posição quase-fixa de câmara.<BR/><BR/>E podem sempre esperar por "Hide and Seek", esse sim! Delicioso! (Eu sei, eu sei, para os críticos aqui da casa vai ser um péssimo filme, mas que posso eu dizer, eles são previsíveis. Lê-se a crítica de Paul Clinton na CNN sobre um filme e é como se a estivesse a ler uns mesitos depois no "Y"... Mas isto é assunto para outro comentário ; )))))
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