O Presidente 'de facto'
Pedro Brás Marques
“No country for weak men” ou “este país não é para fracos”, poderia ser o título alternativo de “Vice”, o biopic de Dick Cheney, o vice-presidente norte-americano durante os dois mandatos de George W. Bush mas que, na verdade, foi o presidente de facto, estendendo “urbi et orbi” a sua influência e o seu poder. <br />Quem estiver minimamente atento ao mundo da política, sabe bem que é um mundo quase sem regras e ainda menos escrúpulos. O vício impera e daí que o título original deste filme de Adam McKay tenha um saboroso “double entendre”, de tanto significar o cargo político ocupado como a característica principal da personagem na sua visão para o Mundo e respectiva execução. O filme cobre a maior parte da vida de Dick Cheney, o que se calhar não terá sido a melhor opção. Porque ele teve uma vida que dava para vários filmes e enfiá-la em pouco mais de duas horas acaba por saber a pouco, até porque a parte mais interessante é, sem dúvida, a sua passagem pela Casa Branca, que praticamente começou, como é sabido, com os ataques de 11 de Setembro às Torres Gémeas e os consequentes conflitos bélicos no Médio Oriente daí resultantes. Esta parte é significativa na narrativa de “Vice”, mas merecia mais, até porque foi um tempo de decisões difíceis e complexas. A parte familiar tem obviamente a sua importância, como contraponto à vida pública e para avaliarmos até onde ia a ambição pessoal do retratado, mas a verdade é que o fascínio pela detenção do poder e respectivo exercício seriam, sempre, as partes mais suculentas da vida de Dick Cheney. <br />Foram tempos complicados na América e no Mundo. Porventura, no meio da tempestade é necessário haver uma personagem com um perfil como o de Dick Cheney, alguém com uma mentalidade pragmática e com objectivos claros e definidos – independentemente de se saber se tinha, ou não, interesses pessoais e financeiros directos ou indirectos nos mesmos… E mais interessante se torna quando nos é revelado que foi um telefonema a mudar o rumo da História, quando Cheney coloca condições para ser vice-presidente, supondo que não seriam aceites, mas são. A própria narrativa brinca com esse momento, ficcionando o que teria sido se tal não tivesse sido aceite e como que terminando o filme quando ainda nem se ia a meio da projecção… <br />Adam McKay, realizador e argumentista, assina aqui o seu segundo filme de peso, depois do brilhante “A Queda de Wall Street”, onde recebeu o Óscar para melhor argumento adaptado. Poderia ter feito outras opções, como atrás se referiu, mas consegue apresentar um "biopic" coerente e vivo. Mas isso deve-se, especialmente, à interpretação de Christan Bale. O facto de nos fazer esquecer o actor já é um sinal de excelência. Mas o actor galês, por vezes apenas pela voz e pela postura, consegue transmitir o lado negro de Cheney, a sua faceta conspirativa, a sombra que tudo cobria. Soberbo. Seria ainda injusto esquecer o papel Lynn Cheney, a fiel mulher e conselheira do vice-presidente, interpretada por uma actriz cujos belos e expressivos olhos há muito merecem o reconhecimento devidos, Amy Adams.
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