Um legado de inteligência
Pedro Araújo
A trilogia "Saw" - que deixa antever um perfume de quarteto de filmes, mais um pormenor da iluminação pós-visionamento da série - alcança novamente o feito de se reinventar a si mesma, repetindo muitos dos ingredientes mas sob uma nova cocção que não deixa de surpreender o espectador. Filme de extremos, não se fica pela violência "cult-slasher", uma vez que provoca os limites do gratuito, ameaçando uma perca de qualidade, para apenas mais tarde (sempre mais tarde, sempre no fim, sempre um pouco mais!) se perceber que essa violência exagerada era exactamente isso, era impossível, era demais, não coincidente com o filme. "Saw" não deixa de ser um filme que não agradará a todos. A violência existe, é forte, muito marcante. Toda a envolvência de "Saw" é suja, sangrenta, escura, repugnante. A prepotência psicológica de Jigsaw chega a ser revoltante, na deificação que faz de si próprio e da sua regra de moral.<BR/><BR/>No entanto, "Saw" é mais que isto, porque é fundamentalmente um filme para os apreciadores do pormenor, aqueles que se abstraem das fortes sensações visuais para se concentrarem no pormenor, na direcção dos olhares, na cera que escorre sobre a cassete, nos "quick-flashes" da "cabeça-de-porco". É um filme, como todos os outros da série, extremamente inteligente, e que ultrapassa largamente a duração de entretenimento de uma sessão de cinema.<BR/><BR/>Recomendo que seja apenas visto depois de se haver visionado os dois anteriores, para realmente apreciar tudo o que se vai desenvolver na película. É uma obra-prima de um género que, após "Seven - Pecados Mortais", é levado a um patamar muito superior, precisamente por jogar em extremos, em extremos que não são apenas o das personagens, mas sim também os extremos sensoriais do público. A não perder.
Continuar a ler