Saber amar
Gonçalo Sá - http://gonn1000.blogspot.com
Se ainda há filmes que valem sobretudo pela força dos diálogos e dos actores, então "Perto Demais" ("Closer") é um desses casos, congregando um muito estimável elenco - Julia Roberts, Jude Law, Clive Owen e Natalie Portman - numa adaptação da premiada peça teatral homónima de Patrick Marber. Se a estes promissores condimentos adicionarmos Mike Nichols, um cineasta com provas dadas - desde os emblemáticos "Who's Afraid Of Virginia Woolf" e "The Graduate", passando pela mini-série "Angels in America" - e um considerável "hype" internacional, então "Perto Demais" tem tudo para se tornar numa aliciante proposta cinematográfica.<BR/><BR/>Abordando as ambivalências das relações humanas, sobretudo as fricções entre o(s resquícios de) amor e o sexo, o filme segue o percurso de quatro personagens à beira do abismo, hesitando entre a segurança e desconforto da solidão e a efervescência imprevisível e não raras vezes dolorosa de um contacto mais próximo - por vezes demasiado próximo - com o outro.<BR/><BR/>"Perto Demais" tem sido quase unanimemente incensado devido à sua perspectiva supostamente perspicaz, densa e aprofundada sobre o complexo universo emocional humano, com um enfoque singular acerca das relações assentes no amor e/ou no sexo. De facto, Nichols apresenta um interessante olhar sobre essa temática, oferecendo um trabalho com alguma tensão dramática, apropriadas atmosferas realistas e assinaláveis doses de um cruel humor negro, mas o seu retrato aposta num abrupto niilismo que lança as personagens numa espiral descendente onde a ingenuidade é um mito e a redenção quase tão improvável.<BR/><BR/>Os protagonistas afastam-se da bidimensionalidade que marca muitas obras próximas destes domínios, mas a sua áspera ambiguidade nem sempre as torna em figuras que envolvam especialmente, uma vez que os ambientes do filme, carregados de frivolidade e cinismo, exageram nas doses de negritude e desolação. O trabalho dos actores é meritório, desde as estrelas em ascensão Clive Owen e Natalie Portman - ambos justamente nomeados para o Óscar de Melhor Actor e Actriz Secundários - até aos mais mediáticos Jude Law (ainda assim, o mais inconstante dos quatro) e Julia Roberts (segura e convincente), mas as suas personagens raramente geram empatia, arrastando-se numa avassaladora teia de infidelidade, mentira, ciúme e traição.<BR/><BR/>Muitos têm elogiado "Perto Demais" por ser um raro filme "mainstream" para adultos, a milhas das rotineiras comédias românticas estereotipadas que banalizam a temática das relações amorosas. Contudo, embora o filme de Mike Nichols trate o tema com inteligência e argúcia q.b., não é propriamente um achado nem uma obra tão ímpar como alguns sugerem. Recentemente, muitos outros títulos têm abordado a tensão conjugal de forma não menos subtil, como "5X2", de François Ozon, "Desencontros" ("We Don't Live Here Anymore"), de John Curran ou "Antes do Anoitecer" ("Before Sunset"), comprovando que o género não está assim tão desfasado e não precisa de ser salvo por uma obra como "Perto Demais".<BR/><BR/>No entanto, se encarado com entusiasmo moderado, o filme de Mike Nichols possui, ainda assim, um boa dose de elementos recomendáveis - a acutilância dos diálogos, a entrega das interpretações, as cruas atmosferas urbanas, a música de Damien Rice - proporcionando uma experiência cinematográfica pertinente e interessante, mas sem o fulgor das obras geniais. Classificação 3/5 - Bom.
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