O lamento do espião
RITA (http://cinerama.blogs.sapo.pt/)
A celeuma à volta de “The Good Shepherd” prende-se essencialmente com o nome de Robert De Niro na realização (pelo menos foi essa a minha motivação). O seu nome trouxe para o projecto uma série de nomes sonantes (William Hurt, Michael Gambon, Alec Baldwin, Billy Crudup, John Turturro, Timothy Hutton, Angelina Jolie, Joe Pesci, e até uma fugaz aparição de Keir Dullea – “2001: A Space Odyssey”), o que não significa necessariamente uma série de interpretações memoráveis. <BR/><BR/>De Niro revela a destreza de quem está dentro do assunto há muito tempo – com algumas soluções esteticamente muito bem conseguidas –, mas o argumento de Eric Roth (co-argumentista de "The Insider” de Michael Mann e de “Munich” de Steven Spielberg) deixa bastante a desejar quer em termos do desenho das personagens quer em termos narrativos. <BR/><BR/>“The Good Shepherd” é uma versão ficcional do nascimento da CIA e dos seus primeiros ano de actividade, centrando a sua acção em torno de personagem de Matt Damon, Edward Wilson, que se baseia livremente numa composição de diversos intervenientes reais da história da agência, entre os quais James Jesus Angleton, um antigo director de contra-informação. <BR/><BR/>Abril 1961. O Senador Philip Allen (William Hurt), encarregue de reportar directamente ao Presidente, quer resposta de Wilson, pois dada a elevada confidencialidade da operação, a fuga de informação deverá ter vindo de uma alta patente da agência. Wilson recebe uma fotografia e uma fita áudio de uma fonte anónima e que deverá estar na raiz do falhanço americano da Invasão da Baía dos Porcos em Cuba. <BR/><BR/>O primeiro de muitos flashbacks leva-nos para os tempos da universidade Yale, a entrada de Wilson na fraternidade Skull & Bones, a sua relação com uma colega surda (Tammy Blanchard), o convite para fornecer informações sobre um dos seus professores (Michael Gambon), suspeito de actividades nazis, o seu casamento com Clover (Angelina Jolie), e a sua imediata saída para o estrangeiro numa operação do Office of Strategic Services (OSS), e o posto de director de contra-informação na recém criada Central Intelligence Agency (CIA). <BR/><BR/>Edward Wilson poderia ser simplesmente um homem duro, mas a personagem de Damon é tão hermética e sem emoções que as suas relações mas íntimas se tornam pouco credíveis, dificultando gravemente a empatia do espectador. E os dilemas morais que ele é forçado a enfrentar não compensam o seu fraco arco evolutivo e a sua previsibilidade. <BR/><BR/>Com saltos temporais nem sempre facilmente identificáveis, “The Good Shepherd” torna-se confuso em vez de misterioso. Sugestões que parecem prometer revelações importantes, revelam-se frustrantes, como é o caso da carta deixada pelo pai de Wilson (e que parecia ser o seu “Rosebud”), o tempo perde-se em cenas dispensáveis como os rituais da fraternidade. Mas “The Good Shepherd” tem um visual sofisticado e uma aura de máfia que consegue, apesar de tudo, ir alimentando o nosso imaginário. E as cenas partilhadas entre Damon e Oleg Stefan, no papel de Ulysses (nome de código do seu homólogo russo) compensam em tensão o tom morno que sobra para o resto. <BR/><BR/>Mas não deixa de ser um pouco deprimente que num filme de espiões – haverá profissão com uma mística mais sedutora? – todos passem a vida a lamentarem-se por não terem amigos verdadeiros e não poderem confiar em ninguém. <BR/><BR/><BR/>6/10
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