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O Atalho

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Drama 102 min 2010 M/12 30/06/2011 EUA

Título Original

Meek's Cutoff

Sinopse

1845. Três famílias de pioneiros contratam Stephen Meek, um guia com experiência no terreno, para os auxiliar a transpor a Cordilheira das Cascatas, no deserto de Oregon, EUA. Confiantes e esperançosos, seguem-no por um atalho sem imaginar que ele se perderia no deserto e os levaria ao pesadelo. Sem água nem mantimentos, o grupo vai ter de encontrar forças e estratégias básicas que lhe permitam sobreviver àquele lugar inóspito. E, quando se cruzam com um indígena, todos vacilam entre confiar num guia que se tem revelado pouco digno ou em alguém que, apesar de mais apto naquele território árido, acreditam ser um adversário natural. Um western com realização de Kelly Reichardt ("Old Joy", "Wendy and Lucy") e argumento de Jonathan Raymond, baseado em diários dos pioneiros encontrados no estado do Oregon. É também uma reflexão sobre as origens dos Estados Unidos e o papel das mulheres na expansão do Oeste americano. PÚBLICO

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Críticas dos leitores

Se isto é um western...

Pedro Vardasca

<p>Tal como a exibição de um alfinete de dama por um punk rocker acabado de fazer 20 anos não tem exactamente o mesmo significado de se ter assistido à estreia dos Sex Pistols no 100 Club, também o reiterado regresso ao western não corresponde à ressurreição do género, há muito terminado como peça expressiva da indústria cinematográfica. Ainda assim, o interesse pelo estado deste antigo reduto de Hollywood revela uma extraordinária perenidade, reavivado a cada nova presença nas salas, embora o produto da análise se assemelhe, normalmente, a um relatório de uma autópsia.<br /><br />Para mágoa dos amadores da dissecação, é impossível enquadrar "O Atalho" na discussão do que o género representa no cinema de hoje, pois sabemos, desde o início do filme, que a acção se desenrola em 1845, o que inviabiliza o rótulo de western, cujo período histórico se localiza nas décadas subsequentes à Guerra de Secessão, com maior incidência na de 80. Como este pormenor cronológico não é acessório, obrigamo-nos a redireccionar o olhar, postando-o fora das convenções da mitologia erigida pelos grandes cultores do western.<br /><br />A narrativa incide sobre um grupo de pioneiros, perdidos algures na desolação do Oregon. A paisagem é exactamente aquela que serve de cenário aos aventureiros dos filmes clássicos, mas o território não estava ainda sob controlo norte-americano, o que só aconteceria em 1846. Neste sentido, os problemas destas famílias referem-se exclusivamente à sobrevivência, necessidade que os lança numa busca desesperada por água, sem que se verifique a participação num esforço colectivo numa região de fronteira do jovem país. As carroças avançam dolorosamente num meio hostil, distantes da presença de qualquer autoridade ou forma de Estado. Não há ataques de índios como manifesto de um choque civilizacional, duelos quando o Sol se esconde no horizonte, rancheiros desavindos pela partilha da terra, "saloons" com balcões a transbordar de gente ébria, manadas a atravessar as pastagens, xerifes a impor a ordem no seio da violência, assaltos a bancos e a diligências, caminhos-de-ferro e telégrafo a anunciarem que o tempo não pára, sólidas amizades masculinas, enfim, não há sinais que especifiquem a presença do western.<br /><br />Por isso, "O Atalho" é outra coisa, talvez uma vinheta sobre um começo modesto, uma nação que se ergue pela via da tenacidade, acalentada pela entoação nocturna de hinos protestantes, uma matriz fundadora que persiste no imaginário norte-americano até ao presente, mesmo que as mutações no tecido social do país nunca tenham cessado. Quando o nosso olhar se detém, percebemos os conflitos emergentes numa sociedade que, com grande esforço, se fez multirracial.<br /><br />A polarização fica a expensas de duas personagens, o guia Stephen Meek, símbolo da intolerância e do espírito de facção que atormentará por muito tempo os Estados Unidos - neste caso para com um nativo americano, entretanto capturado - e a colona Emily Tetherow, apologista da conservação da vida do índio, observado como parte importante na busca que os ocupava, indício de um pensamento integracionista. Entre as duas atitudes, posiciona-se o medo, a incerteza, a desesperança, mas também a fé dos restantes pioneiros, embora a determinação da jovem conduza o grupo pela via da vida, enquanto Meek vaticina a desgraça pela presença do estranho.<br /><br />Alguns apelidaram a narrativa de alegoria, expressão muito satisfatória - e simultaneamente limitada - para o filme de Kelly Reichardt. O silêncio que acompanha a caravana ao longo da jornada representa convincentemente a angústia que flagela a humanidade, consciente das incertezas que sempre atravessaram o espírito dos homens. Em certa medida, "O Atalho" acaba por contextualizar uma veia introspectiva mais comum à cultura e ao pensamento escandinavo num cenário talhado para a acção, o que conferirá originalidade a uma história normalmente retratada com as cores do heroísmo. <br /><br />No entanto, no cinema as ideias, devidamente urdidas para que configurem uma mensagem, nem sempre chegam, como parece acontecer neste microcosmos à deriva. É fácil de perceber que pouco acontece na vastidão, mas esse vazio não pode organizar a cadência de um filme, ou seja, o deserto deve ser preenchido pela espessura das personagens e das experiências que a cada dia se erguem. Neste sentido, "O Atalho" é ultra minimalista, reduzindo-se praticamente ao triângulo descrito, sem existência convincente dos restantes pioneiros, quase tão inexpressivos como o terreno sulcado pelas carroças. É pouco para cinema.</p>
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Procurando Godot

Carlos Natálio / www.ordet1.blogspot.com

<p>Tem sido muito comum o uso da palavra «deambulação» para definir o universo cinematográfico de Kelly Reichardt, um dos nomes mais entusiasmantes do cinema contemporâneo norte-americano. Embora a sua estreia date já de 94, com RIVER OF GRASS, foi sobretudo com a lição de amizade com Will Oldham, OLD JOY (2006), e ainda com WENDY AND LUCY (2008), que Kelly, não só conquistou um lugar próprio como representante de um tempo analógico, a esgotar-se, no cinema, como sugeriu um espaço material, primitivo, no qual as suas personagens viviam como que impassivamente. É precisamente esse tactear subtil do mundo que permitiu a muitos chamar a deambulação para uma espécie de marca autoral da cineasta.<br /><br />Por definição, deambular significa andar sem destino aparente, vaguear, percorrer incessantemente. Bastam os primeiros minutos de MEEK'S CUTOFF para perceber que as três famílias que seguem a trilha principal no deserto do Oregon, no inóspito oeste do século XIX não deambulam, antes decidem desviar-se para obter água, por persuasão do guia Stephen Meek (Bruce Greenwood). Porque é que essa separação com que começa o filme merece destaque? Precisamente porque é ela - e especificamente o facto das suas personagens terem uma meta, a procura de água - que converte o último filme de Kelly Reichardt, reconhecida fã de road movies, não num exercício de deambulação antoniana e sim numa espécie de micro odisseia existencial, em que o abastardado género western serve pretensões, quer cinemáticas, quer teatrais.<br /><br />Cinematograficamente, esse apaziguamento, esse bem-estar das personagens de Reichardt encontram «aliado» interessante na «calma» amarga de Anthony Mann ou Budd Boetticher. O resultado é aqui um western telúrico, em que as linhas do horizonte e dos riachos se cruzam lentamente em transições pictóricas, em que as armas e as lutas do oeste masculino dão lugar, não a uma «visão feminina», mas a um Oeste feito de silêncios, a uma sólida preocupação com a materialidade das acções, quaisquer que sejam - o arranjo de um sapato ou da roda de uma carruagem ou o amassar do pão. Esta é uma luta pela manufactura que se faz em territórios do cinema, pois do outro lado, MEEK'S CUTOFF é também uma história de puros valores morais, veiculados pela teatralidade.<br /><br />Se tradicionalmente as peças de teatro filmadas são feitas num espaço confinado, com os diálogos a preencher o grosso do enredo, em MEEK'S CUTOFF as paisagens desérticas, monocromáticas, de uma aspereza uniforme, convocam o teatral. Trata-se de um espaço visual que, sempre igual a perder de vista, funciona como extensão do negro do teatro, do que está para além do cenário. É aqui que, apesar de também os diálogos não serem abundantes - o argumento de Jonathan Raymond não se baseia em nenhuma peça, é original - a busca pela água se verte numa busca interiorizada, metafísica. A água, essencial como a identidade, é algures «jogada» nesta história de confiança, entre o «amigo» preconceituoso que se engana constantemente sobre o cutoff, o guia Meek, e o «inimigo», o índio, em quem uns acreditam indicar o fim da procura, do jogo, a almejada meta, e outros, o fim da hostilidade geográfica e o início da hostilidade humana, ou seja, o massacre às mãos dos índios.<br /><br />Seja qual for o desfecho, o que interessa a Kelly Reichardt não é a meta, mas também não é a deambulação. É antes o espaço de felicidade que pode conter a pergunta: «o que há para lá daquela colina?»</p>
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Carlos Natálio / www.ordet1.blogspot.com

<p>Tem sido muito comum o uso da palavra «deambulação» para definir o universo cinematográfico de Kelly Reichardt, um dos nomes mais entusiasmantes do cinema contemporâneo norte-americano. Embora a sua estreia date já de 94, com RIVER OF GRASS, foi sobretudo com a lição de amizade com Will Oldham, OLD JOY (2006), e ainda com WENDY AND LUCY (2008), que Kelly, não só conquistou um lugar próprio como representante de um tempo analógico, a esgotar-se, no cinema, como sugeriu um espaço material, primitivo, no qual as suas personagens viviam como que impassivamente. É precisamente esse tactear subtil do mundo que permitiu a muitos chamar a deambulação para uma espécie de marca autoral da cineasta.<br /><br />Por definição, deambular significa andar sem destino aparente, vaguear, percorrer incessantemente. Bastam os primeiros minutos de MEEK'S CUTOFF para perceber que as três famílias que seguem a trilha principal no deserto do Oregon, no inóspito oeste do século XIX não deambulam, antes decidem desviar-se para obter água, por persuasão do guia Stephen Meek (Bruce Greenwood). Porque é que essa separação com que começa o filme merece destaque? Precisamente porque é ela - e especificamente o facto das suas personagens terem uma meta, a procura de água - que converte o último filme de Kelly Reichardt, reconhecida fã de road movies, não num exercício de deambulação antoniana e sim numa espécie de micro odisseia existencial, em que o abastardado género western serve pretensões, quer cinemáticas, quer teatrais.<br /><br />Cinematograficamente, esse apaziguamento, esse bem-estar das personagens de Reichardt encontram «aliado» interessante na «calma» amarga de Anthony Mann ou Budd Boetticher. O resultado é aqui um western telúrico, em que as linhas do horizonte e dos riachos se cruzam lentamente em transições pictóricas, em que as armas e as lutas do oeste masculino dão lugar, não a uma «visão feminina», mas a um Oeste feito de silêncios, a uma sólida preocupação com a materialidade das acções, quaisquer que sejam - o arranjo de um sapato ou da roda de uma carruagem ou o amassar do pão. Esta é uma luta pela manufactura que se faz em territórios do cinema, pois do outro lado, MEEK'S CUTOFF é também uma história de puros valores morais, veiculados pela teatralidade.<br /><br />Se tradicionalmente as peças de teatro filmadas são feitas num espaço confinado, com os diálogos a preencher o grosso do enredo, em MEEK'S CUTOFF as paisagens desérticas, monocromáticas, de uma aspereza uniforme, convocam o teatral. Trata-se de um espaço visual que, sempre igual a perder de vista, funciona como extensão do negro do teatro, do que está para além do cenário. É aqui que, apesar de também os diálogos não serem abundantes - o argumento de Jonathan Raymond não se baseia em nenhuma peça, é original - a busca pela água se verte numa busca interiorizada, metafísica. A água, essencial como a identidade, é algures «jogada» nesta história de confiança, entre o «amigo» preconceituoso que se engana constantemente sobre o cutoff, o guia Meek, e o «inimigo», o índio, em quem uns acreditam indicar o fim da procura, do jogo, a almejada meta, e outros, o fim da hostilidade geográfica e o início da hostilidade humana, ou seja, o massacre às mãos dos índios.<br /><br />Seja qual for o desfecho, o que interessa a Kelly Reichardt não é a meta, mas também não é a deambulação. É antes o espaço de felicidade que pode conter a pergunta: «o que há para lá daquela colina?»</p>
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