Nada de Novo
Ricardo Pereira
Segundo episódio de uma franquia de sucesso, com mulheres à frente e onde, apesar disso, a acção, e não o romance, é o principal – esta é a originalidade da coisa toda. Estas meninas (Drew Barrymore, Cameron Díaz e Lucy Liu) querem mais é se divertir. Não há uma fagulha de seriedade aqui. Quem procura isto, está no filme errado. A montagem ultra-rápida é um sintoma do que se procura aqui: extrema leveza. As piadas são intensivas – mal chega uma, se parte para a próxima. Não se admira que, no final, a gente nem se lembre direito como é que tudo começou - aliás, foi na busca de dois anéis que, juntos, decodificam a lista das pessoas com identidades trocadas que vivem sob o serviço de protecção à testemunha do FBI. É um humor de matiné, epidérmico, cheio de efeitos visuais atraentes e passageiro, que não fará história, nem mesmo nas bilheterias. Demi Moore, quem diria, faz uma espantosa ressurreição como a ex-“Angel” que enverga um biquini com a mesma desenvoltura das “Angels” mais jovens, deixando evidente a sua reconstrução física, toda esguia e muito longe do aspecto bombado que ela exibiu em “Striptease”, de triste memória. Na realidade, o objectivo desta sequência parece ser a realização de vários fetiches do público masculino, já que, ao longo da projecção, as “Angels” usam inúmeros disfarces, aparecendo como stripers, lutadoras, surfistas, soldadoras e até mesmo freiras. Preocupando-se apenas com o factor “entertainement” (leia-se: as “Angels” usando perucas e figurinos reveladores), o roteiro não tem o menor interesse em desenvolver a trama, e chega a criar personagens não para atender às necessidades da história, mas sim para permitir que personalidades como Bruce Willis, John Cleese e Jaclyn Smith possam aparecer em pequenas pontas. Recorte, fragmentação, disparidade: é nessa linha que trabalha o director McG e é nesse terreno que ele decide fincar raiz. O próprio conceito de diversão girl-power de Charlie’s Angels, série e filme, parece ser levado muito menos a sério do que as elipses espaço-temporais e o curto-circuito de situações dramáticas. Além de todas as peripécias em que se envolvem – peripécias que constituem, deve-se dizer, a verdadeira razão de existir do filme – as “Angels” ainda arranjam tempo para terem problemas individuais (que se constituem como a única concessão do filme à lógica narrativa de construção de personagem, evolução na trama, etc.). E nada mais sintomático do que os "dramas" das moças: ir morar com o namorado mas sem anéis de compromisso (Cameron), revelar ao pai a natureza de seu trabalho (Lucy), mas principalmente – e essa é de facto a única trama forte do filme – prolongar infinitamente a união das três moças para além de toda a passagem do tempo.
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