4 estrelas
JOSÉ MIGUEL COSTA
Eis que de Itália chega-nos a "versão século XXI" do incontornável filme de Ettore Scola, "FEIOS, PORCOS E MAUS" (cuja acção presentemente decorre numa Toscana nada maravilhosa, escondida dos roteiros turísticos). Todavia, na sua essência esta obra diverge da original porque, para além de ser, igualmente, dura e bruta, é, em simultâneo, terna e sensível (pese a aparente incongruência - e no fundo, a caracteristica que lhe confere alma/originalidade). Talvez por isso mesmo (e também por estarmos em presença de um "quase documentário" realista com uns toques de lirismo e comédia - uma outra "incongruência"-, que retrata a vida campestre de uma atípica família italiana de ascendência alemã, algo hippie, que subsiste graças à produção de mel), "primeiro estranha-se, depois entranha-se", pelo que é uma película que vamos aprendendo a gostar (de modo cada vez mais intenso) à medida que vai decorrendo tempo sobre a sua visualização. <br /> <br />O foco centra-se sobretudo na doce e inocente Gelsomina (a "gata borralheira das colmeias"), a adolescente que, sem qualquer queixume, "segura as pontas" de uma família desestruturada (embora afectiva ... à sua maneira) que vive um pouco à margem das regras da sociedade em que está (des)inserida, e cujo principal sonho é participar no programa de televisão, "O País das Maravilhas" (concurso populista freak show que premeia as melhores empresas familiares do país), por forma a angariar dinheiro para a subsistência dos seus familiares. E através dela são afloradas temáticas de cariz social e político (sem serem, contudo, exploradas a fundo, uma vez que mais que um "panfleto de denúncias" -embora também o seja-, a realizadora aposta mais na exploração dos afectos), nomeadamente, a crise económica, a falência do Estado Social, a inversão dos papéis na família tradicional, a exploração do trabalho infantil, o machismo, a alienação dos media. Tudo isto recorrendo a alguns episódios surrealistas verdadeiramente deliciosos.
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