5 estrelas
JOSÉ MIGUEL COSTA
4 histórias poderosas, sobre 4 personagens anónimas de 4 províncias distintas da grande potência comunista do capitalismo selvagem, que em determinado momento se cruzaram, por mero acaso (as narrativas estão subtilmente interligadas - contadas de modo sucessivo, e não em paralelo - esqueçam lá o modus operandi do Iñárritu), e que "apenas" têm em comum o facto de terem atingido o seu limite a nível psicológico, e, por esse motivo, num qualquer dia, sem que nada o fizesse prever (ou talvez até fosse expectável, uma vez que a violência quase surge como uma inevitabilidade) revoltam-se contra tudo e contra todos (e acima de tudo contra si próprios, por não conseguirem escapar ao "inevitável"), cometendo actos de violência extrema (filmados de um modo estilizado - criando na brutalidade enquadramentos de uma beleza dura, industrial e fria, morbidamente poéticos), como forma de retaliação contra um sistema que sofreu inúmeras transformações económicas, sociais, culturais, politicas, mas apenas criou disparidades sociais abissais. Os personagens retratados atingiram este limite por (sobre)viverem num contexto opressivo, desenraizados (quase zombies) de uma sociedade em que os valores, as crenças, as narrativas tradicionais (que nesta cultura têm/ou tinham um grande peso) e a esperança foram decompostos ao nível máximo possível, e , deste modo, dá-se o "clic" e passam de vitimas a "carrascos". Mas serão apenas vítimas ou também culpados por serem "peças da engrenagem"? E isso mesmo fica expresso na magnífica sequência de encerramento, na qual somos confrontados com a seguinte questão: "SABES QUAL É O TEU PECADO"? Nada é linear. É A SURREALIDADE DA REALIDADE (e o mais surreal é que trata de um filme baseado em factos reais). "Um Toque de Pecado" (que em não poucos momentos quase se pode classificar como uma obra documental) não é apenas um filme crítico (sem ser politicamente militante e não caindo na tentação de dar lições de moral - prefere "apenas" explanar e servir de ponto de partida para a reflexão) sobre a actual realidade chinesa, acaba por ter um carácter universal, ou não fosse (cada vez mais) a "ética" do dinheiro e dos negócios que subjugam uma maioria da população em detrimento de uma minoria privilegiada e corrupta o "pão nosso de cada dia" em qualquer parte do mundo. Por isso tenham cuidado, pois poderão ser a próxima "vitima" ... ou o "carrasco"!
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